terça-feira, 14 de abril de 2009

A solução do Problema do mal

O mal existente não é por certo aquele chamado metafísico, que envolve a limitação do ser, haja visto que esta não exclui a perfeição dos diversos seres da vida, apenas impede a plenitude do ser, que pertence unicamente a Deus, qualquer que seja Ele.
O mal existente é o físico e moral, que é limitação da natureza, imperfeição de um determinado ser. Porque o homem é racional, inteligente, isto exige subordinação do material ao espiritual, do sensível ao inteligível. E significa que os sentidos são instrumentos do intelecto, e o instinto é instrumento da vontade. Mas algumas vezes, o sentido sobrepuja o intelecto, e o instinto sobrepuja a vontade, levando o homem a viver desarvoradamente contra a sua própria natureza racional. Este é o mal moral, do espírito. Quanto ao mal físico, a cogitação do sofrimento e da morte, se evidenciam contrários a natureza espiritual e racional do homem. Afinal, o homem que é criatura de Deus, Todo Bem, como viria a sofrer e morrer, mesmo que estas não sejam exigências da natureza humana? Como se conciliar a sabedoria e poder de Deus, com o mal no mundo, por Ele criado?
A religião, particularmente a cristã, surge, historiando uma queda do homem no começo da sua história. Do ponto de vista da filosofia, uma queda é possível, lembrando que o ser criado pode por sua natureza desviar-se da ordem : ele é potência, e o livre arbítrio lhe proporciona o modo de efetivamente desviar-se do ser, da racionalidade, enveredando pelo não-ser.
Através da religião, pela revelação, a Escritura e a Tradição, evidenciam que o homem primeiro, possuía uma harmonia natural, e teria sido elevado à ordem sobrenatural, com dons preternaturais. Este gozo da vida de Deus, seria por graça. Também evidencia-se que esta harmonia e dignidade, foram perdidas, devido a um orgulho no homem primeiro,contra Deus. O pecado original, que é a privação do sobrenatural, do único fim efetivo do homem, voluntário e culpado em Adão, o homem primeiro, seria herdado por seus decendentes. Resta então, uma enfermidade, uma debilidade espiritual e física na natureza humana, essencial desde o nosso nascimento.
Entretanto, visto que a posição original do homem é gratuita, pela graça de Deus, não devido à natureza humana, nem aquela criada, a privação desta não poderia causar a vulnerabilidade do homem, nem a perda dos dons preternaturais. Então não pode ser a causa do mal no mundo, considerado insolúvel pela filosofia pura. O dogma do pecado original, pode assim explicar o fato do mal no mundo, mas não o sentido deste, num mundo que deveria ser racional, visto ser criado pela Sabedoria divina, que não pode deixar de dar às naturezas, por Ela criada voluntariamente, as perfeições que lhes competem para a efetiva realização delas.
A religião cristã, entra com o seu segundo dogma, o da redenção, operacionalizada por Jesus Cristo, identificado como o Messias da revelação, o Redentor. O Verbo de Deus, Cristo, encarna, assumindo a humanidade caída, absorvendo o sofrimento humano até à morte, e morte de cruz, a fim de reparar o pecado original, bem como suas consequências naturais. Sendo Deus-Homem, por natureza, sua operação tem valor divino e humano; infinito, devido à dignidade do operante. Em vista da Sua natureza, o ato redencional teria sido o mínimo possível. Então, Seu sacrifício deve ter outro significado. Este, está no fato de que Ele quis dar satisfação rigorosa à justiça divina, ao redimir o gênero humano. Na encarnação, Deus, manifesta a sua inefável e essencial bondade para com o homem. O bem do homem, não pode se realizar fora da glória de Deus, quer na criação, quer na redenção.
Como consequência do ato redentor, o homem foi readmitido na ordem sobrenatural, foi-lhe restituída a graça, foi restaurado a adoção divina. Mas não goza da intimidade do Criador, como o seu protoparente Adão, a não ser no caso das almas eleitas. Embora, outra vez, estas dádivas sendo ausentes, não suscitem o problema do mal no mundo, ou seja, em elas faltando, não geram o mal premente, porque não são bens devido à natureza humana. Nem mesmo a desordem da natureza foi reconstituída. O homem continua sofrendo a violência dos sentidos contra a razão, passando pelo sofrimento e morte, mesmo que graça divina lhe seja dada para enfrentar o mal, e até mesmo vencê-lo. Por que mesmo depois da redenção efetivada pelo Verbo de Deus, o mal continua existente na vida humana, como consequência do pecado original?
A razão está no fato de que a redenção, deixa como pena o mal decorrente dos pecados, possibilita o homem expiar a culpa mediante a pena. Porque Cristo aponta o caminho da cruz, como caminho perfeito de vida, como renúncia voluntária dos grandes bens do mundo. Porque Cristo na cruz estabelece a glória de Deus, para o bem maior do homem, no reino do mal que se seguiu ao pecado vigente no mundo. Deste modo, o sofrimento serve de expiação do próprio pecado, e de holocausto, para o ser criado se conscientizar de que ele é nada por si diante do Ser Supremo Criador, na nova ordem das coisas. Deste modo, o sofrimento é tomado como instrumento ético, tomado como mortificação, é uma medida para um organismo espiritual enfermo.
Mas por que Deus não impediu desde o princípio o pecado, de maneira que a glória de Deus e o bem do homem se pudessem realizar pelo caminho da alegria antes que do sofrimento? Porque, segundo Agostinho, Deus julgou melhor tirar o bem do mal, do que permitir ao mal não existir, para a maior glória de Deus e também do homem.

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